Exposição “A Cura pela Arte” – Verbetes dos Autores

Dezembro 2, 2010 in Blogue

Alexander Wiesbaum, natural de Lisboa, trabalha a madeira. Com formação teórica e prática em marcenaria na Alemanha, país de origem de seu pai. Após alguns workshops com artistas caldenses nas áreas de escultura e serigrafia, partiu para a fusão criativa das técnicas aprendidas. Apresenta nesta exposição sólidos geométricos, sob forma de duas pirâmides, e peças orgânicas que exploram uma gramática evolutiva do trabalho em madeira. A serigrafia “Perdido no Tempo e no Espaço” é um trabalho experimental, onde pela primeira vez usou a técnica de serigrafia aplicada em madeira, com assinalável resultado final. Trabalha a forma piramidal numa linha de investigação das propriedades energéticas deste antiquíssimo símbolo sagrado.

Ofélia Reis, criadora ecléctica tem percorrido várias técnicas e vários estilos, sobretudo na pintura. Radicada em Torres Vedras, onde à décadas exerce o magistério de ensino das artes visuais, nunca abandonou a expressão própria em função da profissão de professora. A composição cromática das aguarelas que nos apresenta é soberba e faz irradiar destas obras uma luminosidade que lhes confere um magnetismo muito próprio. A serigrafia inscreve-se numa estética que Ofélia Reis tem vindo a explorar ao longo da sua carreira, representado figuras zoomórficas com características naif, sobretudo gatos e pássaros, que partilham ambientes com nus femininos em poses íntimas de refrescante abandono e sensualidade.

Tânia Maurício debate-se desde muito jovem com um tumor no cérebro que afectou o seu pleno desenvolvimento cognitivo. Frequenta o ensino especial onde tem desenvolvido uma particular apetência e sensibilidade pela pintura. Na sua auto-expressão plástica tem encontrado o meio certo de relação com o mundo e com a comunidade que a rodeia. Apresenta dois trabalhos onde se reconhece uma aprendizagem técnica e temática seguras, com particular sensibilidade para a composição policromada que compõe a sua paleta e com uma conjugação de técnicas respigadas de obras de grandes mestres da pintura universal. Actualmente o seu tumor está estabilizado.

Maria João Monterroso, descobriu o hobbie da fotografia à cerca de 10 anos. Tem vindo, desde então, a apurar o seu sentido de observação através da lente, dedicando-se sobretudo à fotografia de natureza. Desde que foi mãe a sua filha tornou-se o seu modelo privilegiado na constituição de um portfólio íntimo e de afectos. Nesta exposição apresenta também três presépios pintados, como costuma fazer anualmente nesta quadra para presentear alguns amigos.

Paula Violante, propõe-nos duas esculturas em cerâmica, explorando o grés enquanto matéria e linguagem. Inscreve-se na tradição cerâmica caldense, que assume sem abdicar de a transformar, sob respaldo da sua aprendizagem de artes plásticas na ESAD. Os dois trabalhos em grés têm um fundo antropomórfico comum. Incompleto, num caso, fragmentado, noutro. Uma das peças assenta referências tão antigas e profundas como a Vénus de Milo ou a Vénus de Willendorf, pela ausência de membros e pela sugestão de fertilidade do ventre arredondado. A outra escultura é uma continuidade da primeira, na homenagem ao universo sensorial feminino, apresentando fragmentos anatómicos numa fusão que surpreende. Esta segunda obra remete, em certa medida, para as formas orgânicas de Henry Moore, sem a sua escala e abstracção, sublinhando-se, no entanto, uma sensualidade comum.

António Loureiro, está presente nesta exposição com três pinturas a acrílico – duas na loja A. Flores e outra no Club de Inverno. É um autodidacta que descobriu a pintura quando se reformou da vida profissional. A paisagem e ambiente urbano que pinta têm origem nas fotografias que faz, nas suas viagens pelo país. Da sua vida profissional, enquanto desenhador técnico, trás o conhecimento e o rigor que lhe permitem desenvolver uma técnica apreciável. A sua sensibilidade pessoal exprime na tela uma riqueza cromática que supera as fotografias que servem de base a cada pintura.

Lina Félix, apresenta uma pintura a óleo onde as figuras humanas sugerem diversos vectores da espiritualidade humana. Está presente a iconografia católica mais tradicional, expressa numa cruz e num terço, em diálogo com elementos de vertentes mais orientalizantes ou tropicais da relação da espécie humana com o mistério da fé. A atitude de meditar ou de orar é comum a todas as culturas e religiões, independentemente da forma como se assume e manifesta. Essa é a postura de humildade perante o divino que se explora e sugere neste trabalho.

Bolota é Isabel Claro, ceramista de Caldas da Rainha e fundadora do Atelier Bolota, nesta cidade de profunda tradição cerâmica. Ceramista desde os 16 anos, desenvolve a olaria contemporânea num equilíbrio entre métodos tradicionais e técnicas e estéticas actuais, numa marcada vertente autoral. Apresenta nesta exposição um vaso policromado, um candelabro estilizado em espiral ascendente, e um azulejo com uma cruz e salpicos abstractos que evocam o dripping de Jacson Pollock, de brilho ampliado pelo vidrado cerâmico.

Susana S. Jorge, ceramista natural do baixo Alentejo, está radicada em Caldas da Rainha. Integra o Atelier Bolota onde estagiou no âmbito de uma formação teórico-prática no CENCAL. As peças de Susana S. Jorge ligam-se a um imaginário popular e fantástico, presente na cerâmica portuguesa desde tempos imemoriais. São trabalhos que recuperam uma memória colectiva de insondáveis raízes identitárias, que rendem homenagem a Rosa Ramalho, figura incontornável da cerâmica popular portuguesa do século XX, a que Susana S. Jorge dá continuidade com grande vigor expressivo e cromático. Participa nesta exposição com trabalhos de pequena escala, presentes na loja A. Flores, em Caldas da Rainha, e na Galeria Arte em Espírito, na Foz do Arelho.

Alda Caetano, é autodidacta e descobriu a pintura durante o período em que enfrentou a doença oncológica, realizando assim um sonho que acalentava desde a adolescência. O seu trabalho pictórico não denúncia a doença que enfrentou, revelando uma abertura temática ao mundo. Foi o metier da arte que manteve a sensibilidade da autora em contacto com tudo o que a rodeia, resistindo ao auto-centramento, tantas vezes o resultado natural do estado de doença. As três pinturas que integram esta mostra descobrem uma sensibilidade que se exprime em abstracções sensoriais que projectam uma natural harmonia no público e no espaço. Alda Caetano enfrentou o cancro em 2006. Actualmente sente-se curada.

Maria do Rosário Vala frequenta o ensino especial na Cerci-Peniche onde desenvolve as suas capacidades e aptidões através da expressão plástica. A sua pintura é puramente naif e reveladora de um mundo próprio muito afectivo e muito intenso. A escolha sobretudo de cores primárias e outras cores fortes como o verde e, neste contexto o branco, são a expressão da intensidade e simplicidade com que observa o que de mais importante a rodeia. As limitações ao nível do desenho e da perspectiva conferem ao seu trabalho a inocência e nitidez que o faz exprimir uma grande genuinidade.

Gilberto Valente é licenciado em Artes plásticas pela ESAD. Desde os tempos de estudante que expõe os seus trabalhos em mostras individuais e colectivas. Actualmente é professor de Educação Visual e Tecnológica, continuando a desenvolver trabalho próprio que expõe regularmente. O trabalho que nos apresenta, em arte digital, é um mosaico narrativo que se inscreve na gramática da BD e do cartoon e nos relata uma história. Gilberto Valente respondeu assim ao convite a expor, no âmbito do Projecto Olha-Te, sensibilizado pela missão de apoio a doentes oncológicos e familiares. A obra que propõe resulta da sua proximidade a esta problemática pelo acompanhamento da doença de um familiar muito próximo.

Vitor Silva frequenta o ensino especial na Cerci-Peniche onde desenvolve as suas capacidades e aptidões através da expressão plástica. Representa a sua aldeia com grande candura e simplicidade, numa expressão naif bastante sugestiva, ainda que formalmente desequilibrada, como é próprio deste género. A utilização de elementos cerâmicos colados à pintura revela já uma capacidade compositiva adquirida pela aprendizagem que abona a instituição que frequenta.

José Pires é um dos artistas caldenses há mais tempo em actividade, vivendo exclusivamente da sua arte há mais de 30 anos. É um autodidacta da pintura a óleo e acrílico com conhecimento profundo do seu ofício. Começou a sua aprendizagem e o seu percurso criador no sector da cerâmica, nomeadamente nas empresas de faiança Bordalo Pinheiro e Secla, onde privou e partilhou trabalho e experiências com outros grandes nomes da criação contemporânea, como são Ferreira da Silva ou José Aurélio, que também integravam o Laboratório de Criação Cerâmica. Desde sempre fascinado pelo universo feminino, é na representação abstracta e sensual da mulher que se encontram os seus melhores trabalhos, e onde é imediatamente reconhecível a sua marca autoral. A pintura de José Pires emite uma vibração muito própria: a sensualidade nunca é algo de banal, antes pelo contrário – o corpo é matéria e caminho adequado para alcançar a elevação espiritual, como preconizavam algumas civilizações e cultos pré-cristãos.

Jorge Muchagato é artista plástico e professor de História de Arte. Radicou-se em Caldas da Rainha para onde veio leccionar na ESAD. Apresenta-nos um representação pictórica do coração enquanto órgão anatómico, sob título “Look in to Yourself”. Este órgão musculoso que nos dá vida bombeando o sangue que corre nas veias, contem a expressão simbólica dos sentimentos e dos afectos, da sensibilidade e da consciência, da coragem e do valor intrínseco do ser humano. É o centro e a voz secreta que cada um de nós procura nos momentos mais íntimos e mais intensos. Jorge Muchagato desafia-nos assim, através de um jogo entre significante e significado, a uma auto contemplação que transcende a matéria e busca algo de mais profundo.

Concha Rozas e Magda Moita juntaram-se para homenagear Maria José Salavisa, na sua passagem e presença pela vila de Óbidos. A escultura presente foi concebida na lógica site specific, nunca se tendo concretizado este objectivo por circunstancialismos diversos. O seu lugar seria junto ao cipreste plantado por Maria José Salavisa no quintal da sua casa de Óbidos, actualmente o Museu Abílio Mattos e Silva, que foi seu marido. Concha Rozas conheceu e conviveu muitos anos com Maria José Salavisa em Óbidos, e conhece o significado profundo que aquele pequeno arbusto, plantado pelas mãos de Maria José, e que se transformou numa vigorosa e imponente árvore tinha para esta artista. O Tigre é uma representação da própria Maria José, que Concha via como uma exuberante força da natureza. Nas culturas orientais, “o Tigre é uma representação superior da consciência, é a consumação e integração dos opostos, ele é o curador, o iniciador, integrando na sua essência o poder de transmutar o antagónico”, nas palavras de Magda Moita. Não tendo até ao momento ocupado o seu lugar de destino, tem soltado a sua energia em espaços públicos e privados no triângulo Óbidos, Caldas da Rainha e Foz do Arelho.

Catarina Paramos é natural de Caldas da Rainha e deputada eleita da Assembleia Municipal. Tem uma particular afinidade com a Associação Recreio Club e com o Projecto Olha-Te, por laços familiares e afectivos. Integra esta exposição com duas fotografias com aplicações em tecido, explorando assim um imaginário e uma prática artesanal do universo feminino. Quer pela escolha da natureza dos materiais, e a cor em que se apresentam, quer pela relação que estabelecem com o fundo fotográfico, é toda uma atmosfera do lazer e dos tempos livres das mulheres de gerações anteriores que se evocam.

João Carvalho é natural de Caldas da Rainha e tem um percurso profissional ligado à decoração, à concepção de stands em feiras temáticas e ao mercado de antiguidades. Com formação específica na área das Tecnologias de Materiais tem privilegiado a pasta de papel como matéria-prima no design de peças próprias. Apresenta nesta mostra alguns espelhos emoldurados e uma escultura/cabide. A ligação do espelho ao sentido material da interpelação do Projecto Olha-te cria uma sintonia de significados e uma comunhão de valores concretizada pela devolução da imagem de cada pessoa que se expõe a um destes objectos. Os dois espelhos em forma de coração materializam um apelo directo a cada sujeito de se ligar ao que de mais profundo encontra nas suas emoções, sentimentos e consciência.