Leilão
Dezembro 18, 2010 in Blogue
A venda do Espelho-Coração acabou por não se concretizar no contexto do leilão. Assim sendo, a obra continuará à venda, pelo valor de 95 euros, até ao final da exposição “A Cura pela Arte”.
Dezembro 4, 2010 in Historial do Olha-te
A abertura da exposição correu harmoniosamente. O espaço encheu… foi importante a interação dos “pilares” do projecto entre si e com o público. Estiveram todos presentes, aqueles que nesta fase estiveram mais empenhados, a Ana Marta Ramos, a Marisa Lourenço, a Maria João Monterroso, a Marta Saudade e Silva, o Lino Romão, o Francisco Gomes, o Alexander Wisbaum, o Paulo Matias e o meu pai, Fernando Antunes. São aqueles que dão muito do seu tempo, do seu potencial, que se entregam ao projecto de variadas formas e que fazem com que ele reflita a organização e o rigor que o sustentam.
A organização da exposição esteve em permanente ação durante este últimos dias (e algumas noites…). A Magda Moita e o Michael Thomas, parceiros através da Galeria Arte em Espírito, foram incansáveis e vieram ajudar também na montagem e na distribuição dos trabalhos da exposição dos dois núcleos de Caldas da Rainha.
Alguns artistas acompanharam-nos com maior proximidade durante a montagem – e deram um contributo valiosíssimo também nesta fase. Um Obrigado especial a eles.
Saiu do artista João Carvalho a ideia de leiloar uma peça dele. Mais adiante daremos detalhes sobre esta iniciativa, já com data marcada para17 de Dezembro pelas 21h30 no espaço do edifício Capristanos.
O espaço do edifício Capristanos, que é grande, encheu, o que proporcionou uma dinâmica interessante. Olhei de repente e a casa estava cheia, as pessoas circulavam, conversavam, conheciam-se, trocavam ideias. A minha família estava presente, o que me deu um conforto, pois o seu apoio sempre foi muito importante para mim.
A meio da tarde abrimos o núcleo da sede do projecto Olha-Te, no “Club de Inverno”. Aqui as obras expostas estão perfeitas no espaço. Até parece que foram pensadas exactamente para a sala que agora ocupam. São em menor número, uma vez que este é o espaço de trabalho permanente do projecto Olha-Te, mas quisemos abrir as portas para que todos possam vir conhecer este local, para nós tão especial.
A inauguração da exposição na Galeria de Arte em Espírito foi às 17h e terminámos lá o nosso percurso deste feriado. O horário aqui é a partir das 17h00 e segue pela noite dentro, até à meia-noite. Convida-nos a passear pela Foz do Arelho ao fim do dia ou durante a noite e a parar para contemplar arte lá exposta, acompanhada de um momento de lazer e convívio. Uma noite diferente.
E com o 1º de Dezembro demos inicio à exposição “Cura pela Arte” e ao mês de Natal. O Natal é um convívio da família, de encontro de amigos e de afectos – tal como foi este dia para mim.
Célia Antunes
Dezembro 2, 2010 in Blogue
Alexander Wiesbaum, natural de Lisboa, trabalha a madeira. Com formação teórica e prática em marcenaria na Alemanha, país de origem de seu pai. Após alguns workshops com artistas caldenses nas áreas de escultura e serigrafia, partiu para a fusão criativa das técnicas aprendidas. Apresenta nesta exposição sólidos geométricos, sob forma de duas pirâmides, e peças orgânicas que exploram uma gramática evolutiva do trabalho em madeira. A serigrafia “Perdido no Tempo e no Espaço” é um trabalho experimental, onde pela primeira vez usou a técnica de serigrafia aplicada em madeira, com assinalável resultado final. Trabalha a forma piramidal numa linha de investigação das propriedades energéticas deste antiquíssimo símbolo sagrado.
Ofélia Reis, criadora ecléctica tem percorrido várias técnicas e vários estilos, sobretudo na pintura. Radicada em Torres Vedras, onde à décadas exerce o magistério de ensino das artes visuais, nunca abandonou a expressão própria em função da profissão de professora. A composição cromática das aguarelas que nos apresenta é soberba e faz irradiar destas obras uma luminosidade que lhes confere um magnetismo muito próprio. A serigrafia inscreve-se numa estética que Ofélia Reis tem vindo a explorar ao longo da sua carreira, representado figuras zoomórficas com características naif, sobretudo gatos e pássaros, que partilham ambientes com nus femininos em poses íntimas de refrescante abandono e sensualidade.
Tânia Maurício debate-se desde muito jovem com um tumor no cérebro que afectou o seu pleno desenvolvimento cognitivo. Frequenta o ensino especial onde tem desenvolvido uma particular apetência e sensibilidade pela pintura. Na sua auto-expressão plástica tem encontrado o meio certo de relação com o mundo e com a comunidade que a rodeia. Apresenta dois trabalhos onde se reconhece uma aprendizagem técnica e temática seguras, com particular sensibilidade para a composição policromada que compõe a sua paleta e com uma conjugação de técnicas respigadas de obras de grandes mestres da pintura universal. Actualmente o seu tumor está estabilizado.
Maria João Monterroso, descobriu o hobbie da fotografia à cerca de 10 anos. Tem vindo, desde então, a apurar o seu sentido de observação através da lente, dedicando-se sobretudo à fotografia de natureza. Desde que foi mãe a sua filha tornou-se o seu modelo privilegiado na constituição de um portfólio íntimo e de afectos. Nesta exposição apresenta também três presépios pintados, como costuma fazer anualmente nesta quadra para presentear alguns amigos.
Paula Violante, propõe-nos duas esculturas em cerâmica, explorando o grés enquanto matéria e linguagem. Inscreve-se na tradição cerâmica caldense, que assume sem abdicar de a transformar, sob respaldo da sua aprendizagem de artes plásticas na ESAD. Os dois trabalhos em grés têm um fundo antropomórfico comum. Incompleto, num caso, fragmentado, noutro. Uma das peças assenta referências tão antigas e profundas como a Vénus de Milo ou a Vénus de Willendorf, pela ausência de membros e pela sugestão de fertilidade do ventre arredondado. A outra escultura é uma continuidade da primeira, na homenagem ao universo sensorial feminino, apresentando fragmentos anatómicos numa fusão que surpreende. Esta segunda obra remete, em certa medida, para as formas orgânicas de Henry Moore, sem a sua escala e abstracção, sublinhando-se, no entanto, uma sensualidade comum.
António Loureiro, está presente nesta exposição com três pinturas a acrílico – duas na loja A. Flores e outra no Club de Inverno. É um autodidacta que descobriu a pintura quando se reformou da vida profissional. A paisagem e ambiente urbano que pinta têm origem nas fotografias que faz, nas suas viagens pelo país. Da sua vida profissional, enquanto desenhador técnico, trás o conhecimento e o rigor que lhe permitem desenvolver uma técnica apreciável. A sua sensibilidade pessoal exprime na tela uma riqueza cromática que supera as fotografias que servem de base a cada pintura.
Lina Félix, apresenta uma pintura a óleo onde as figuras humanas sugerem diversos vectores da espiritualidade humana. Está presente a iconografia católica mais tradicional, expressa numa cruz e num terço, em diálogo com elementos de vertentes mais orientalizantes ou tropicais da relação da espécie humana com o mistério da fé. A atitude de meditar ou de orar é comum a todas as culturas e religiões, independentemente da forma como se assume e manifesta. Essa é a postura de humildade perante o divino que se explora e sugere neste trabalho.
Bolota é Isabel Claro, ceramista de Caldas da Rainha e fundadora do Atelier Bolota, nesta cidade de profunda tradição cerâmica. Ceramista desde os 16 anos, desenvolve a olaria contemporânea num equilíbrio entre métodos tradicionais e técnicas e estéticas actuais, numa marcada vertente autoral. Apresenta nesta exposição um vaso policromado, um candelabro estilizado em espiral ascendente, e um azulejo com uma cruz e salpicos abstractos que evocam o dripping de Jacson Pollock, de brilho ampliado pelo vidrado cerâmico.
Susana S. Jorge, ceramista natural do baixo Alentejo, está radicada em Caldas da Rainha. Integra o Atelier Bolota onde estagiou no âmbito de uma formação teórico-prática no CENCAL. As peças de Susana S. Jorge ligam-se a um imaginário popular e fantástico, presente na cerâmica portuguesa desde tempos imemoriais. São trabalhos que recuperam uma memória colectiva de insondáveis raízes identitárias, que rendem homenagem a Rosa Ramalho, figura incontornável da cerâmica popular portuguesa do século XX, a que Susana S. Jorge dá continuidade com grande vigor expressivo e cromático. Participa nesta exposição com trabalhos de pequena escala, presentes na loja A. Flores, em Caldas da Rainha, e na Galeria Arte em Espírito, na Foz do Arelho.
Alda Caetano, é autodidacta e descobriu a pintura durante o período em que enfrentou a doença oncológica, realizando assim um sonho que acalentava desde a adolescência. O seu trabalho pictórico não denúncia a doença que enfrentou, revelando uma abertura temática ao mundo. Foi o metier da arte que manteve a sensibilidade da autora em contacto com tudo o que a rodeia, resistindo ao auto-centramento, tantas vezes o resultado natural do estado de doença. As três pinturas que integram esta mostra descobrem uma sensibilidade que se exprime em abstracções sensoriais que projectam uma natural harmonia no público e no espaço. Alda Caetano enfrentou o cancro em 2006. Actualmente sente-se curada.
Maria do Rosário Vala frequenta o ensino especial na Cerci-Peniche onde desenvolve as suas capacidades e aptidões através da expressão plástica. A sua pintura é puramente naif e reveladora de um mundo próprio muito afectivo e muito intenso. A escolha sobretudo de cores primárias e outras cores fortes como o verde e, neste contexto o branco, são a expressão da intensidade e simplicidade com que observa o que de mais importante a rodeia. As limitações ao nível do desenho e da perspectiva conferem ao seu trabalho a inocência e nitidez que o faz exprimir uma grande genuinidade.
Gilberto Valente é licenciado em Artes plásticas pela ESAD. Desde os tempos de estudante que expõe os seus trabalhos em mostras individuais e colectivas. Actualmente é professor de Educação Visual e Tecnológica, continuando a desenvolver trabalho próprio que expõe regularmente. O trabalho que nos apresenta, em arte digital, é um mosaico narrativo que se inscreve na gramática da BD e do cartoon e nos relata uma história. Gilberto Valente respondeu assim ao convite a expor, no âmbito do Projecto Olha-Te, sensibilizado pela missão de apoio a doentes oncológicos e familiares. A obra que propõe resulta da sua proximidade a esta problemática pelo acompanhamento da doença de um familiar muito próximo.
Vitor Silva frequenta o ensino especial na Cerci-Peniche onde desenvolve as suas capacidades e aptidões através da expressão plástica. Representa a sua aldeia com grande candura e simplicidade, numa expressão naif bastante sugestiva, ainda que formalmente desequilibrada, como é próprio deste género. A utilização de elementos cerâmicos colados à pintura revela já uma capacidade compositiva adquirida pela aprendizagem que abona a instituição que frequenta.
José Pires é um dos artistas caldenses há mais tempo em actividade, vivendo exclusivamente da sua arte há mais de 30 anos. É um autodidacta da pintura a óleo e acrílico com conhecimento profundo do seu ofício. Começou a sua aprendizagem e o seu percurso criador no sector da cerâmica, nomeadamente nas empresas de faiança Bordalo Pinheiro e Secla, onde privou e partilhou trabalho e experiências com outros grandes nomes da criação contemporânea, como são Ferreira da Silva ou José Aurélio, que também integravam o Laboratório de Criação Cerâmica. Desde sempre fascinado pelo universo feminino, é na representação abstracta e sensual da mulher que se encontram os seus melhores trabalhos, e onde é imediatamente reconhecível a sua marca autoral. A pintura de José Pires emite uma vibração muito própria: a sensualidade nunca é algo de banal, antes pelo contrário – o corpo é matéria e caminho adequado para alcançar a elevação espiritual, como preconizavam algumas civilizações e cultos pré-cristãos.
Jorge Muchagato é artista plástico e professor de História de Arte. Radicou-se em Caldas da Rainha para onde veio leccionar na ESAD. Apresenta-nos um representação pictórica do coração enquanto órgão anatómico, sob título “Look in to Yourself”. Este órgão musculoso que nos dá vida bombeando o sangue que corre nas veias, contem a expressão simbólica dos sentimentos e dos afectos, da sensibilidade e da consciência, da coragem e do valor intrínseco do ser humano. É o centro e a voz secreta que cada um de nós procura nos momentos mais íntimos e mais intensos. Jorge Muchagato desafia-nos assim, através de um jogo entre significante e significado, a uma auto contemplação que transcende a matéria e busca algo de mais profundo.
Concha Rozas e Magda Moita juntaram-se para homenagear Maria José Salavisa, na sua passagem e presença pela vila de Óbidos. A escultura presente foi concebida na lógica site specific, nunca se tendo concretizado este objectivo por circunstancialismos diversos. O seu lugar seria junto ao cipreste plantado por Maria José Salavisa no quintal da sua casa de Óbidos, actualmente o Museu Abílio Mattos e Silva, que foi seu marido. Concha Rozas conheceu e conviveu muitos anos com Maria José Salavisa em Óbidos, e conhece o significado profundo que aquele pequeno arbusto, plantado pelas mãos de Maria José, e que se transformou numa vigorosa e imponente árvore tinha para esta artista. O Tigre é uma representação da própria Maria José, que Concha via como uma exuberante força da natureza. Nas culturas orientais, “o Tigre é uma representação superior da consciência, é a consumação e integração dos opostos, ele é o curador, o iniciador, integrando na sua essência o poder de transmutar o antagónico”, nas palavras de Magda Moita. Não tendo até ao momento ocupado o seu lugar de destino, tem soltado a sua energia em espaços públicos e privados no triângulo Óbidos, Caldas da Rainha e Foz do Arelho.
Catarina Paramos é natural de Caldas da Rainha e deputada eleita da Assembleia Municipal. Tem uma particular afinidade com a Associação Recreio Club e com o Projecto Olha-Te, por laços familiares e afectivos. Integra esta exposição com duas fotografias com aplicações em tecido, explorando assim um imaginário e uma prática artesanal do universo feminino. Quer pela escolha da natureza dos materiais, e a cor em que se apresentam, quer pela relação que estabelecem com o fundo fotográfico, é toda uma atmosfera do lazer e dos tempos livres das mulheres de gerações anteriores que se evocam.
João Carvalho é natural de Caldas da Rainha e tem um percurso profissional ligado à decoração, à concepção de stands em feiras temáticas e ao mercado de antiguidades. Com formação específica na área das Tecnologias de Materiais tem privilegiado a pasta de papel como matéria-prima no design de peças próprias. Apresenta nesta mostra alguns espelhos emoldurados e uma escultura/cabide. A ligação do espelho ao sentido material da interpelação do Projecto Olha-te cria uma sintonia de significados e uma comunhão de valores concretizada pela devolução da imagem de cada pessoa que se expõe a um destes objectos. Os dois espelhos em forma de coração materializam um apelo directo a cada sujeito de se ligar ao que de mais profundo encontra nas suas emoções, sentimentos e consciência.
Novembro 30, 2010 in Atividades Pontuais, Blogue
Venha passar uma tarde divertida connosco no Café Pópulus, com vista para o parque D. Carlos I. O chef João Quaresma vai partilhar connosco a sua infinita sabedoria e ensinar-nos a colorir a mesa de Natal com entradas e outros pormenores criativos e deliciosos!
Vamos todos pôr a mão na massa, que é a melhor forma de aprender. E depois terminamos em beleza, a degustar as iguarias confecionadas 🙂
Novembro 28, 2010 in Blogue
A Arte nas Nossas Vidas.
Ars Longa, Vita Brevis” – A vida é curta, a arte é eterna,
Primeiro aforismo de Hipócrates, pai da medicina grega.
A arte está hoje presente em todos os dias nas nossas vidas. A todo o momento que descemos uma rua de uma qualquer cidade, quando entramos numa praça, ou nos dirigimos a uma qualquer instituição, que não tem de ser necessariamente um museu ou um centro cultural, esbarramos com a presença de obras de arte. Quando estamos na sala de espera de um médico, de um advogado, no escritório de um grande empresário ou de um contabilista, ou mesmo no gabinete de um modesto comerciante, é provável estarmos a contemplar algum objecto artístico. Porque é que isto acontece? Para que serve toda esta arte que povoa o nosso quotidiano? A resposta pode, em certa medida, ser simples: a arte humaniza o espaço, torna-nos mais sensíveis e perceptivos, promove, pelas suas qualidades intrínsecas, a nossa liberdade, no plano individual como no colectivo. A arte faz-nos sentir melhor. Mais pessoas.
A designação da exposição A Cura pela Arte remete para uma qualidade de acção da arte de actuar sobre o humano com uma capacidade transformadora. Não se trata, com certeza, de substituir o acto médico, de substituir o acompanhamento terapêutico necessário a quem se debate com a enfermidade. A arte não é uma vacina, ou um qualquer outro remédio, sobretudo deverá estar longe de ser um anestesiante. Não tendo propriedades curativas no sentido médico-cientifico, é no entanto algo de que todos nos aproximamos mais em momentos de fragilidade, procurando algum conforto interno. Tem essa inexplicável propriedade de tocar emoções, desenvolver a sensibilidade, insuflar ânimo e afinar energias com o universo que nos rodeia, devolve-nos, em alguma medida, o sentido da vida. Ou como nas palavras de Antonin Artaud, “Ninguém alguma vez escreveu ou pintou, esculpiu, modelou, construiu ou inventou senão para sair do inferno”.
Podemos perceber que alguém subitamente confrontado com uma enfermidade grave se torne mais sensível às artes. Provavelmente pelas razões aduzidas por Gilles Deleuze, em relação com a nossa citação de Hipócrates em epígrafe, quando afirma que “A obra de arte é algo que perdura e nessa medida vence a morte. A obra de arte é um acto de resistência”. E o ser humano, em tensão com o mundo, devido a uma enfermidade inesperadamente diagnosticada ou por outro motivo qualquer, é naturalmente um resistente. Quando confrontados, seja de que forma for, com a ideia de morte, queremos vence-la. A arte é tantas vezes o campo de batalha onde se trava espiritualmente essa batalha, talvez pelo motivo adiantado por Francis Bacon, importante pintor do século XX, quando afirma que “O desespero e a infelicidade esticam toda a sensibilidade”.
A exposição A Cura pela Arte reúne um conjunto eclético de 28 criadores, distribuídos pelos três espaços que os vão acolher. Esta exposição começou por ser pensada em vários núcleos em função dos objectivos do Projecto Olha-te e pela relativa limitação de espaço da sua sede. Não tínhamos dúvidas da adesão dos criadores ao apelo de solidariedade para com os doentes oncológicos. Sabíamos que não se poderiam acomodar todos os que gostaríamos na sede do Projecto Olha-te, mas entendemos ser importante colocar ali um núcleo da exposição. Este é um espaço que existe em função da solidariedade, da qualidade de vida de pessoas fragilizadas, em suma, do sentido de humanidade para com o outro.
Os criadores que integram esta exposição incorporam também o espírito do Projecto Olha-te, constituindo um pequeno universo muito diverso, onde, no entanto, predomina a pintura como linguagem, ainda que expressa em diferentes estilos e técnicas. Assumidamente não descriminámos criadores quando seleccionamos profissionais e amadores, ou dito de outro modo, quando integramos artistas com escola, com currículo, com experiência e com carreira, com outros de expressão mais modesta. Numa perspectiva inclusiva do Projecto Olha-te entendemos incluir também autodidactas e dois utentes da Cerci Peniche, que aderiram com igual espírito filantrópico. Sublinhamos mesmo esta participação destes dois criadores, como o exemplo vivo de quem faz diariamente da arte uma ferramenta efectiva e afectiva para elevar a sua qualidade de vida e a sua passagem pelo mundo, como afirmava Máximo Gorki na sua Carta aos Jovens Escritores: “O talento desenvolve-se no amor que pomos no que fazemos. Talvez até a essência da arte seja o amor pelo que se faz, o amor pelo próprio trabalho.”
Tivemos desde logo a preocupação de que a narrativa expositiva resultasse numa combinação equilibrada entre os participantes e a sua distribuição pelos três núcleos. Contando com a generosidade de todos concebemos a implantação da exposição tentando evitar o preconceito e incorrer em alguma desvalorização, ainda que não deliberada, dos autores autodidactas, tendo sempre presente que tantas vezes esses se superam e também atingem patamares de excelência, como são exemplos maiores na nossa literatura Jorge de Sena, em nome próprio, e Rómulo de Carvalho, sob pseudónimo de António Gedeão. Ambos com formação nas áreas das ciências puras e ambos escritores, poetas admiráveis e incontornáveis do século XX, na história da cultura portuguesa.
Se a arte e a medicina têm uma relação tão antiga como o primeiro aforismo de Hipócrates, fundador da medicina moderna, não tendo a arte nenhuma propriedade mágica que por si resulte num efeito curativo, como o próprio Hipócrates já se recusava a aceitar, visão de que sempre tentou distanciar-se, não será menos verdade que a obra de arte ganha ressonância interna em cada um de nós. Obras diferentes, de modo diferente em pessoas diferentes. Afinal o mundo contemporâneo é o mundo da diversidade infinita e cada indivíduo, em termos de sensibilidade pessoal, continua a ser o centro do seu próprio mundo. Mas se cada um de nós quiser responder à eterna questão: Afinal, o que é arte? Como poderá responder cada um de nós a esta questão? Talvez encontremos a resposta em Anton Tchekhov, “As obras de arte dividem-se em duas categorias: as de que gosto e as de que não gosto. Não conheço outro critério.” E a organização da exposição A Cura pela Arte espera que o público goste das obras que escolhemos para compor esta mostra. Que aqui encontre bons motivos para acrescentar o seu acervo pessoal, praticando também um gesto de apoio que afirme o valor simbólico da solidariedade.
Lino Romão, Curador da Exposição